08/11/2012

O tamanho importa?

Lembro-me bem do primeiro livro de contos que li: Amor numa Rua Escura, de Irwin Shaw. Estava habituada a romances, na coleção «Dois Mundos», e os contos foram uma surpresa. Depois do «primeiro capítulo», o seguinte apresentava novas personagens e um outro enredo, o que me deixou intrigada. Ainda esperei que as duas histórias se viessem a cruzar, coisa que não aconteceu. Ao terceiro conto, aceitei que eram narrativas independentes e continuei a ler. Embora tivesse acabado a leitura com uma sensação de estranheza por estas histórias tão diferentes entre si estarem guardadas sob a mesma capa, percebi que gostava da fórmula. Os contos espelham bem a brevidade e/ou a intensidade de alguns acontecimentos. E o facto de serem necessariamente concentrados torna-os ideais para muitos casos. Contudo, há um certo preconceito para com o conto.

A moderna forma literária por excelência é o romance. O romance é complexo, extenso e quem consegue dominar esta maneira de contar histórias é glorificado por isso. Mas, para quem ainda não se tinha apercebido, aqui fica a novidade: um conto, uma novela ou uma micro ficção podem ser tão ou mais complexos do que um romance. Não é por um livro ter 450 páginas que se torna mais admirável. Aguentar boa prosa ao longo de muitas páginas é, sem dúvida, meritório, mas… e concentrar ideias? Trabalhar com limitações? É-o menos? Afinal, Carlos Lopes e Francis Obikwelu são ambos campeões.

E todavia... O romance é a fórmula que a maioria dos leitores de hoje parece preferir. A maioria dos editores alinha, considerando as coletâneas de contos arriscadas do ponto de vista comercial. A novela ainda é mais difícil de definir e vender, algures entre o conto e o romance. A micro ficção, então, fica-se praticamente pela internet, raramente passando a livro. Ao que parece, para muitas pessoas, quanto mais páginas tem uma obra, mais compensa o tempo e dinheiro gastos nela, como se a economia de escala se aplicasse à literatura.
O romance merece o destaque que tem, naturalmente. Há motivos para isso. Mas as outras formas literárias não devem ser deixadas em segundo plano. E não sou só eu a achá-lo. Ian McEwan e os editores da Paris Review, por exemplo, estão comigo.

A verdade é que o tamanho nada diz da qualidade. Um bom haiku tem mais conteúdo do que todas as letras do Quim Barreiros (e não são poucas). Por vezes, menos é mais. Os maus escritores, aliás, costumam ser prolixos escrever não lhes custa, não pensam muito no que põem no papel. 

Não julgue um texto pela forma. Melhor ainda: não julgue a forma. De todo. O verdadeiro leitor (e escritor) atenta às palavras, seja qual for o meio em que estas lhe cheguem.

Se nunca leu contos, experimente. Pegue num livro de vários contos do mesmo autor, em que uma única voz atravessa as diversas histórias, ou pegue numa coletânea de vários autores, se quiser provar um pouco de tudo.

E se quer começar a escrever ficção e a ideia de um romance o intimida, comece pelos contos ou por outras fórmulas mais curtas. A beleza da escrita é poder assumir todas as formas que se queira.


Caso ainda não acredite que a brevidade pode ser genial, aqui fica a mais curta história de terror do mundo:
The last man on Earth sat alone in a room. There was a knock on the door...

Sem comentários:

Enviar um comentário