Este conselho – «escreve sobre as coisas que conheces» –, que se dá recorrentemente a quem escreve ou quer escrever, será útil para muitos, mas deixa-me paralisada. É verdade que, como aconselhei aqui, tenho a vantagem de já ter tido várias profissões, de já passado por muitos universos, mas para se escrever sobre aquilo que se sabe é preciso saber-se alguma coisa, e eu, precisamente, nada sei. Não tenho grandes certezas na vida, não acredito em nada dogmaticamente, matei cedo quase todos os ídolos, não me julgo portadora de qualquer verdade universal, pelo menos não de uma original ou que mereça transmissão direta. Assim, que me resta? Escrever sobre o que não sei. (É claro que posso escrever receitas de bolos que conheço, mas não é disso que estamos a falar.) E isto é vertiginoso. Sempre que dou «o» passo e me proponho escrever qualquer coisa minha, à minha frente, o abismo.
Felizmente, que a companhia sempre conforta, não sou a única com vertigens. E depois, claro, há uma ou outra citação amiga:
Ao escrevermos, como evitar que escrevamos sobre aquilo que não sabemos ou que sabemos mal? É necessariamente neste ponto que imaginamos ter algo a dizer. Só escrevemos na extremidade de nosso próprio saber, nesta ponta extrema que separa nosso saber e nossa ignorância e que transforma um no outro.
Gilles Deleuze
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